Uma das sagas de que se falou muito no ano anterior foi a incompleta A Song of Fire and Ice, que actualmente vai no seu quinto volume A Dance With Dragons. Intrigada com o entusiasmo da comunidade por estes livros e pela série que neles se baseia e que, dentro em breve, inicia a sua segunda temporada, não hesitei em colocar A Game of Thrones na minha lista de leituras. Entretanto, já tive a oportunidade de ler os quatro primeiros livros e, além de as obras não desapontarem no geral, permitiram que tomasse contacto e reflectisse sobre o modo como o autor decidiu contar a sua história: até agora, todos os livros encontram-se divididos em capítulos narrados sob o ponto de vista de uma das personagens, sendo que o número de pontos de vista diferentes em cada livro ultrapassa a dezena.
É uma história que não foca nenhuma personagem; em vez disso, uma ampla selecção delas contribui com um pouco dos eventos vistos pela sua perspectiva, alargando os horizontes de quem lê através da transmissão dos seus próprios valores, passados, ambições, localizações geográficas e personalidades muito particulares. Neste último aspecto, julgo que o autor foi brilhante: cada personagem, desde o anão Tyrion ao bastardo Jon Snow e passando por todas as outras, tem uma maneira de se expressar que é característica e que não é passível de ser confundida com nenhuma outra. A maioria são personagens extremamente ricas, pormenorizadas, completas em todas as suas dimensões.
Uma história construída com base em múltiplos e detalhados pontos de vista nunca permitirá a distinção de um único herói, de uma personagem principal. Não se pode afirmar que A Song of Fire and Ice seja a história de Daenerys, de Arya ou de Jon. Deixamos de ter um único modelo e, eventualmente, personagens em que o foco não incide mas que de alguma forma nos despertam interesse para passarmos a ter vários modelos, com um foco transitório que a todos dá um breve momento de ribalta para em seguida passar o testemunho a outro.
Considero este estilo muito interessante no sentido em que possibilita o desenvolvimento de todo um elenco de personagens, e talvez por isso a série consiga seguir tão fielmente os livros e satisfazer os fãs. Seria engraçado ver capítulos com pontos de vista de outras personagens noutros livros como, por exemplo, Hermione ou Draco em Harry Potter (se bem que os títulos dos livros deixassem de fazer tanto sentido). Por um lado, traria ao de cima personagens ignoradas ou menosprezadas pela dita personagem principal mas que poderiam muito bem trazer riqueza à história; por outro lado, seria uma refrescante lufada de ar fresco acompanhar outro ponto de vista - nota-se um elemento adicional na composição da história e isso traduz-se numa sensação de satisfação com o detalhe e profundidade da obra.
Não estou muito familiarizada com este tipo de narração noutras obras, contudo, há uns anos, comecei a escrever uma história que, salvo erro, continha cinco pontos de vista diferentes que se sucediam continuamente e que pertenciam a um grupo de amigos que cumpria uma missão. Lembro-me que um dos aspectos mais divertidos era, de facto, o passar para outra personagem e imaginar como cada um via e interpretava à sua maneira um mesmo acontecimento: um era mais fatalista, outra mais corajosa, um outro tinha sempre umas palavras de conforto, e por aí fora. Não cheguei a terminá-la, mas o seu planeamento fez-me aprender algumas coisas - escrever uma determinada história uma e outra vez mas sob o ponto de vista de personagens diferentes é uma excelente maneira de nos apercebermos do quão desenvolvida e trabalhada se encontra essa mesma personagem.
Apesar de tudo, não é, claro, um género de narração perfeito. É certo que garante a tal riqueza e diversidade, mas tanta diversidade pode, também, trazer algum cansaço e repetição. A linha temporal avança, à partida, muito mais lentamente, e isto poderá exasperar um leitor menos paciente que não está interessado no ponto de vista daquela personagem tanto quanto está ansioso por descobrir o que vai acontecer a seguir. Além disso, a técnica dos pontos de vista múltiplos faz com que o leitor ganhe invariavelmente gostos e preferências em relação a personagens específicas assim como indiferença ou deprezo em relação a outras, o que poderá significar igualmente uma leitura muito apressada nos capítulos de determinadas personagens e uma muito mais cuidada noutros. No meu caso e referindo-me novamente a A Song of Fire and Ice, tive muita dificuldade em ler os capítulos do Davos e alguns da Daenerys, por exemplo - estes últimos porque a acção era passada num local tão remoto e tão diferente da restante linha de eventos que não conseguia interessar-me por aquela perspectiva.
Apesar de tudo, não é, claro, um género de narração perfeito. É certo que garante a tal riqueza e diversidade, mas tanta diversidade pode, também, trazer algum cansaço e repetição. A linha temporal avança, à partida, muito mais lentamente, e isto poderá exasperar um leitor menos paciente que não está interessado no ponto de vista daquela personagem tanto quanto está ansioso por descobrir o que vai acontecer a seguir. Além disso, a técnica dos pontos de vista múltiplos faz com que o leitor ganhe invariavelmente gostos e preferências em relação a personagens específicas assim como indiferença ou deprezo em relação a outras, o que poderá significar igualmente uma leitura muito apressada nos capítulos de determinadas personagens e uma muito mais cuidada noutros. No meu caso e referindo-me novamente a A Song of Fire and Ice, tive muita dificuldade em ler os capítulos do Davos e alguns da Daenerys, por exemplo - estes últimos porque a acção era passada num local tão remoto e tão diferente da restante linha de eventos que não conseguia interessar-me por aquela perspectiva.
Para quem ainda não leu, aconselho se gostarem de uma história com algumas reviravoltas imprevisíveis, repleto de fortes personagens em constante perigo e passado num mundo inspirado na época medieval mas de tal modo bem explorado em todas as suas vertentes que ele quase é, também, uma personagem.
Já há séculos que não leio blogs e deparei-me com este post no Twitter (A Song of Ice and Fire chamou-me atenção, como podes calcular =P). De facto, a narrativa feita do ponto de vista de personagens distintas acaba por não ser tão linear, prende mais a atenção. E vou ver se consigo ir lendo no telemovel, não está a ser fácil, mas hei de conseguir xP Por acaso li os livros da Witcher Series no tlm num instante.
ResponderEliminarGostava de poder ler um pouco desta tua história, parece interessante ;) Eu voltei a escrever, mas continuo presa num ponto de onde não sei como sair, por isso às vezes vou avançando para outros momentos (a minha escrita cheia de gaps é absolutamente fabulosa xD). E preciso de tempo para fazer alguma investigação, estou seriamente a pensar em arranjar um livro mais específico sobre a fase pré-cristianismo na Escandinávia. Gostaria que o meu livro fosse mais preciso em termos geográficos e temporais.
E pronto, desculpa a invasão, foi uma escapatória simpática do relatório do ISM no qual irei pegar já já já xD
Beijinhos** <3
Olá! Não sabia que tinhas uma conta no blogger ^_^ Ainda hei-de ler a saga The Witcher... é engraçado porque acabei de procurar os livros na Amazon e só encontro o primeiro (Blood of Elves) e no "Frequently Bought Together" vem um outro de histórias do The Witcher que é o The Last Wish juntamente com... A Game of Thrones :D
EliminarPosso levar-te a história se quiseres - e se a encontrar ;) Se calhar precisavas de fazer um NaNoWriMo ou um Camp NaNoWriMo para treinares o preenchimento de "buracos" e a narração sem saltar cenas; o Camp NaNoWriMo, em especial, é bom para nós, porque há dois e um é em Agosto (http://campnanowrimo.org/pages/about) ^_^. Apoio a tua ideia para um livro e adorava acompanhar o processo e o resultado!
E não tens de pedir desculpa pela invasão; aliás, invade quando quiseres! E fizeste-me o dia porque foi o primeiro comentário <3
(reescrito para aparecer como resposta ao comentário)