sábado, 10 de dezembro de 2011

Relatos de um NaNoWriMo


No mês passado, um dos principais desafios a que me propus foi o NaNoWriMo, uma iniciativa que os participantes concluem com sucesso se escreverem, de raiz, um livro com um mínimo de 50000 palavras. Podem, contudo, trabalhar no esboço e planificação do seu livro antes, se assim o entenderem. Para se "ganhar" o NaNoWriMo, é feita uma validação final do número de palavras através de um contador do próprio site, para onde são copiadas as histórias; um sistema que depende inteiramente da honestidade dos participantes.

Este foi o meu segundo NaNoWriMo; já o tinha tentado pela primeira vez em 2008, alcançando o objectivo das 50000 palavras e pelo caminho explorando substancialmente uma história que actualmente ainda está numa fase de desenvolvimento. Para este NaNoWriMo não trazia quaisquer planos senão o desejo de passar para o papel a história de uma personagem em que pensava há já algum tempo: uma história em que, pura e simplesmente, escreveria tudo o que me apetecesse, com todos os clichès que daí pudessem advir. Decidi também escrever em Inglês, no que constituiria um dos grandes desafios deste NaNoWriMo, pois nunca antes me havia aventurado a escrever uma história de tamanha dimensão nesta língua.

Esta foi a sinopse que publiquei no meu perfil do NaNoWriMo:
"Improvised novel, not so much improved characters. When Eleanor Sheach takes upon herself to study the noble arts of Healing Magic, she is far from imagining the many adventures and individuals she will encounter in the way, including a Potions-expert neurotic girl, a serious hardworking blacksmith conceiling a secret and a flirtatious, wealthy swordfighter with a penchant for saving damsels in distress. New storylines blossom from every corner in this wondrous tale of humour and romance, but also of courage and loyalty."


Comecei com entusiasmo, mas cedo vieram a verificar-se os mesmos problemas que há três anos atrás: semanas preenchidas com aulas, doença, obrigações várias... houve dias em que não escrevi uma única palavra e outros em que escrevi mais de 5000. No fim, diverti-me muito com todo o enredo que ia criando na altura, como se as personagens soubessem muito bem o que iam fazer a seguir. Uma relação, em particular, surpreendeu-me, entre a minha personagem principal Eleanor e a sua melhor amiga, a tal rapariga neurótica que sabia muito de Poções - as suas conversas revelavam-se do mais cómico que havia por vezes, e eu a imaginar o que uma dizia à outra já me ria antes sequer de me pôr a escrever.

Ainda assim, as dificuldades nos meus hábitos de escrita continuaram a fazer-se sentir e, a dois dias do fim do NaNoWriMo, vi-me a braços com cerca de 10000 palavras em atraso. Voltava a ser uma situação semelhante à da minha primeira tentativa, em que me lembro de ter feito uma maratona de escrita nos últimos dias para poder chegar às 50000 palavras, e teria feito o mesmo este ano se o meu computador não tivesse aproveitado a ocasião... para avariar. Com ele foram uma colecção de ficheiros que não tinham sido guardados em mais nenhum dispositivo, incluindo o meu livro.


Quando, ao recuperar o uso do computador, me apercebi que a minha história tinha desaparecido, não fiquei demasiadamente triste. Posso reescrevê-la noutra ocasião, com mais empenho: os eventos continuam bem frescos na minha mente e até sobreviveram alguns excertos, nomeadamente aqueles que tinha em papel. Além disso, ela cumpriu o seu propósito e eu aprendi muito com este mês de Novembro. Aprendi que três qualidades são fundamentais para a conclusão de um NaNoWriMo: aproveitamento de tempo, disciplina e repressão da auto-edição.

Aproveitamento de tempo. Para se escreverem precisamente 50000 palavras em trinta dias, devem ser escritas 1667 palavras por dia. Isto pode não parecer muito, mas, dia após dia, torna-se difícil aproveitar o tempo livre para nos dedicarmos à escrita; às vezes pensamos até: "Mas que tempo livre?" A solução passa por examinar criticamente a rotina do dia-a-dia e identificar momentos em que poderíamos escrever. É importante colocar a escrita num dos primeiros lugares da lista de prioridades: deve tornar-se a actividade "base" da nossa linearidade de pensamentos, ou seja, a actividade para onde nos devemos voltar assim que outras tarefas importantes foram concretizadas e nos perguntamos o que poderemos fazer a seguir. 

De igual forma, é importante aproveitar o tempo da própria escrita, focando a atenção e não divagando para outros assuntos ou problemas. Compreendi rapidamente que a melhor maneira de escrever mais em menos tempo consistia em organizar "guerras de palavras" com a minha pupila do NaNoWriMo: combinávamos que ao fim de 15 minutos quem apresentasse o maior número número de palavras escritos nesse periodo era o vencedor dessa guerra. Eu não tinha grande noção da minha velocidade, quando escrevia levada pela história sem pensar em mais nada, portanto foi grande a surpresa quando constatei que era capaz de escrever mais de 600 palavras em 15 minutos! Se conseguisse manter o ritmo, era capaz de perfazer o total diário necessário em pouco menos de 45 minutos, o que é interessante.


Disciplina. Não basta o entusiasmo inicial; é também precisa muita determinação e persistência. Talvez, com o passar dos dias, há quem encontre uma rotina confortável e se apoie nessa rotina para escrever; eu não o consegui fazer, mas em contrapartida tentei fixar números de palavras e só deixaria de escrever quando chegasse a determinada meta. No NaNoWriMo, se não se escreve diariamente ou pelo menos com relativa frequência, é muito complicado depois recuperar dos atrasos que se acumulam como uma bola de neve. Se não é possível a aquisição de um hábito diário, então que, ao menos, não percamos de vista o objectivo final e optemos por uma estratégia que o cumpra.


Repressão da auto-edição. Do NaNoWriMo não se querem obras-primas, histórias meticulosamente trabalhadas e geniais em todos os aspectos; o resultado é, geralmente, imperfeito, confuso, diluído, desprovido de sentido. É normal ser assim. Considero o resultado como um mapa da mente do escritor, ali desenrolado e estendido para que ele possa entender os seus próprios artifícios, maneira de pensar, tendências. O livro que sai do NaNoWriMo é um esboço e um esboço apenas; assim, não faz sentido que se edite muito enquanto se escreve; haverá muito tempo para isso em Dezembro e nos meses seguintes. No NaNoWriMo, importa a quantidade: quer isto dizer que se deve escrever tudo quanto venha à cabeça e que se veja como seguimento ao que já se escreveu.

Para mim, foi difícil escrever com linearidade na primeira tentativa e acabei por saltar alguns eventos, escrevendo também diálogos que ainda não se inseriam em qualquer parte. Isto também é válido, mas para este NaNoWriMo desafiei-me a não passar à frente quaisquer partes, mesmo aquelas que me pareciam ser aborrecidas de escrever. Concluí que até as partes que previa trazerem-me tédio podiam tornar-se interessantes a qualquer momento e que o seguimento da linearidade trazia-me, a mim, maior satisfação no momento de passar a uma cena que já estava ansiosa por escrever.


No próximo post publicarei uma série de entrevistas que fiz a três participantes do NaNoWriMo deste ano. Até daqui a uns dias!

2 comentários:

  1. Ganhei em 2008, tal como tu. E ganhei em 2011, tal como tu terias ganho se não te tivesse caído em cima essa montanha de azar. Admiro-te por conseguires manter a calma perante tal catástrofe, acho que enlouquecia.

    Pode parecer-te ridículo, mas não acredito que tivesse participado num único NaNoWriMo se não tivesse sido o Reino da Escrita. Deves estar provavelmente cansada de eu estar sempre a bater na mesma tecla, mas a importância que o fórum deve para mim foi brutal, essencial. Não que o mundo fique a ganhar alguma coisa com a minha escrita, prosa ou poesia que seja, mas ajudou-me a encontrar esta paixão pelo mundo das letras. Obrigado, Eri!

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    1. Sinceramente, fiquei surpreendida comigo mesma! Foram muitas horas de volta do computador, como bem saberás, mas na altura foi tão relaxante escrever o que me apetecia que quando percebi que não iria recuperar o texto nem consegui ficar triste por muito tempo... sobretudo porque se tratava apenas de uma história para Novembro e não um projecto ambicioso. Mas certamente que vou tentar reproduzi-la num futuro NaNoWriMo e vai ser um desafio interessante :)

      Ah, não me parece nada ridículo. Deixa-me feliz, muito, muito feliz. Se consegui com que visses a escrita de outra maneira, se contribui de algum modo para que experimentasses novas formas de te exprimires, então julgo que o Reino cumpriu muito bem o seu propósito. E, na minha opinião, o mundo só pode ficar a ganhar quando alguém desperta para qualquer tipo de arte, por isso explora bem essa tua paixão e ajuda a enriquecer este mundo com a tua perspectiva única.

      Por outro lado, estou contente porque tinha perdido a tua conta no blogger e hoje de repente apercebi-me que te podia adicionar noutras redes sociais... as tecnologias da actualidade! Há muito tempo que não leio nada teu, manda-me uma mensagem se precisares de alguma opinião/comentário. ;)

      (reescrito para aparecer como resposta ao comentário)

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